13. A ideologia do fim das ideologias
Vivemos, todo o mundo vive, novos tempos, tempos difíceis e incertos. Mas são tempos insustentáveis que certamente, a curto prazo, significarão mudanças decisivas no complexo e caótico sistema global em que uma oligarquia financeira multinacional, ferozmente liberal e sem ética, mergulhou, económica e socialmente, as vidas das pessoas.
Verifica-se que o Mundo gira à volta dessas oligarquias económico-financeiras bem organizadas e competindo a nível global. Os Estados e as suas democracias perderam força e liberdade decisória com os partidos políticos manietados e mesmo mandatados para gerir este sistema liberal (ou “darwinista”) da lei do mais forte.
Criou-se uma doutrina ou ideologia dominante que apregoa a falta de alternativa, ou seja, nada há a fazer contra as leis da natureza. É a ideologia do fim das ideologias. Adquirem-se e usam-se todos os meios para conformar e moldar o pensamento dos cidadãos a estas chamadas verdades consensuais. É a ditadura da verdade inquestionável ou do pensamento único.
Somos “evangelizados” todos os dias por consagrados economistas que, nos fragmentos da sua suposta ciência, têm uma visão de sociedade pior que um veterinário teria sobre um rebanho de carneiros. Depois vêm uma segunda e terceira linhas de opinadores independentes com toda uma panóplia de corolários também assumidos como consensuais.
Um exemplo perfeito desta lógica inquestionável pode-se espelhar na opinião de J. A. Saraiva publicada em edição do semanário “Sol” com frases como: “Os grandes grupos multinacionais (…) hoje têm o planeta inteiro para (…) procurar os salários mais baixos, (…) as menores regalias dos trabalhadores. O planeta tornou-se um sistema de vasos comunicantes – (…) Para certas regiões subirem o nível de vida, outras vão necessariamente perder privilégios.”
Ou seja, incute-se a falsa ideia dos ‘vasos comunicantes’ para justificar a perda necessária de privilégios (?) de alguns. Puro engano, pois, se o nível de vida de algumas regiões sobe, será sempre à custa de salários muito mais baixos, na lógica dos menores custos humanos globais na produção. Então, é como se houvesse qualquer vaso roto vertendo a favor desses grandes grupos.
Além disso, nunca é questionável se, com o aumento da produção, o excesso de riqueza deva reverter apenas para esses grandes grupos.
Por fim, apregoando a invocada falta de alternativa e o consequente apelo à renúncia passiva, o articulista continua: “Basicamente, não há nada a fazer. (…) Muitas das ‘conquistas dos trabalhadores’ na Europa, obtidas no pós-guerra, vão regredir. (…) Preparem-se, porque não vale a pena protestar. O que não tem remédio remediado está.”
Mas a verdadeira verdade não se compadece com verdades feitas. E a crise está aí para durar como maleita estrutural desta ganância neo-liberal. Em termos simples, temos a contradição de querer produzir onde não se consome para poder consumir onde não se produz. E isto só foi possível enquanto o consumo se pagava com a dívida creditada num futuro virtual que já desmoronou. É o colapso de uma D. Branca à escala mundial.
Por isso estes são tempos insustentáveis que, a curto prazo, acarretarão mudanças decisivas. Poderemos assistir a graves crises sociais e nacionais com as mais nefastas convulsões à escala internacional ou, em alternativa, saberemos usar a força de uma democracia ideologicamente esclarecida capaz de assegurar o primado da cidadania.
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